Através da internet estou tendo a honra de conhecer e conversar com alguns indígenas, de várias partes do Brasil quase que diariamente. Além da grande responsabilidade, repito, sinto-me honrada por ter sido aceita dentre o rol de amigos que compõe suas páginas de relacionamento e, por já ter recebido de alguns o aval para compartilhar com todos os leitores deste blog suas histórias. Faço questão de registrar aqui, não por soberba, mas por gratidão, o carinho e atenção que tenho recebido do grande Paulo Celso Villas-Bôas, da Liana Utinguassú, uma guerreira guarani e escritora, além do Professor Dr. Edson Hely Silva, pesquisador da Cultura Xukuru do Ororubá e professor do Colégio de Aplicação da UFPE, dos meus irmãos xukuru do Ororubá, do Deputado Luiz Eduardo Cheida (Paraná ), TC Ricardo Santos, e tantos outros amigos que, dedicam suas vidas a transformar, idéias em ações, com foco no ser humano, somar, multiplicar atitudes positivas. Aos leitores deste blog, a quem dedico o meu melhor, sempre com a escolha de bons textos, meu respeito e gratidão.
Apresento-vos a primeira de uma série de narrativas, de relatos, depoimentos e histórias de vida de nossos índios, e desde já, registro meu carinho ao parente, amigo e irmão Tanielson: Porãn - Iporã Eté (meu profundo agradecimento).
Eu, Tanielson Rodrigues da Silva- PORAN POTIGUARA 19 anos, pertenço ao povo indígena Potiguara da Paraíba-PB e estudo na Universidade de Brasília-UnB, na qual faço engenharia florestal.
O povo Potiguara vive em uma área de 33.339 hectares, na qual suas aldeias estão vinculadas a três municípios: Baía da Traição com 13 aldeias, Marcação com 14 e Rio Tinto com 4. O território indígena tem três divisões: A Terra Indígena-TI Potiguara de São Miguel, a TI de Jacaré de São domingos e a TI de Monte-mor. Os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE de 2006 revela que existam aproximadamente 12 mil Potiguaras. De acordo com nossas lideranças hoje seria 16 mil, isso contando com os que moram em grandes capitais como São Paulo, Rio de Janeiro e etc.
Os relatos que comprovam a existência desse povo no litoral paraibano desde 1501, quando o famoso navegador Américo Vespúcio descreve-os como índios traidores. “Dois Frades Franciscanos pedem pra ir até o litoral na intenção de ter algum contato com aquele povo desconhecido. Ao chegar à praia, duas belas nativas se aproximam tirando-lhe a atenção, outras duas se aproximam por trás e os acertam com um objeto de madeira. Arrastaram seus corpos até o alto de um monte, onde há uma espécie de fogueira, cortavam seus corpos e esquentava-os no fogo, antes de comer-los, os mostravam na direção das naus...” (LETTERA- 1º DOCUMENTO PARAIBANO). O navegador vendo tais atos resolve nomear aquele local até então desconhecido pelos colonizadores, de BAÍA DA TRAIÇÃO. Além do mais, Potiguara é o único povo do litoral que permaneceu no local de origem desde a colonização do Brasil. Ou seja, não mudou seu habitat até os dias de hoje.
Petiguara (comedores de fumo), piticaxara(dono dos vales). Como cita alguns cronistas em seus documentos, são alguns dos nomes que recebiam os Potiguaras (comedores de camarão) . É um povo que tem na sua organização social, o cacique como o líder superior. Em cada aldeia também existe um cacique, que pode ser
Aos 13 anos de idade, eu participei da II Assembléia de meu povo em 2003. Ali tive a primeira oportunidade de representar a juventude estudantil Potiguara, porque era aluno do colégio Pedro Poti, que é uma escola diferenciada, ou seja, voltada à cultura de meu povo. No decorrer daquele encontro, foi proposto que alguns alunos do ensino diferenciado falassem um pouco do contexto trabalhado naquela escola. Não estava preparado para aquele momento, mas minhas lideranças me indicaram e aquele dia foi a primeira de muitas. Dessa assembléia em diante, passei a tomar gosto pela causa e sou um dos mentores da Organização dos Jovens Indígenas Potiguara da Paraíba (OJIP-PB). Tudo começou pela necessidade da juventude, pois estavam sendo formadas organizações de professores, de mulheres e etc. Mas não tinha nenhuma com uma política especifica para os jovens. Daí no decorrer de alguns encontros foi criada a nossa organização, onde eu era vice-coordenador geral. Aos poucos fui conquistando espaço dentro da política de meu povo. Juntei a necessidade de meu povo com meu sonho e me tornei universitário da UnB. Vim com o objetivo de se formar e trabalhar em prol das comunidades indígenas do Brasil, em especial as Potiguaras.
Desde pequeno já sonhava em ser um engenheiro florestal, mas não imaginava que iria estudar tão longe da família e do meu povo. Não é fácil sair de casa em busca de um sonho e atrás de uma
Na minha casa são cinco pessoas: Eu, meu irmão, minha irmã e meus pais. Meu pai é professor e estar concluindo nesse ano o curso de geografia na Universidade Federal da Paraíba-UFPB. Minha mãe passou quinze anos sem estudar, mas concluiu o médio comigo na mesma turma e tendo o meu pai como professor. Meus irmãos estão terminando o ensino médio, e assim como eu, pensam em cursar o superior. Talvez eles não possam vim estudar aqui na UnB. Não porque não tenham capacidade, mas porque penso que nossos pais não deixariam os três filhos ficarem fora de casa por tanto tempo e ao mesmo tempo. Pra eu estar aqui foi maior sacrifício, mãe não queria deixar de jeito nenhum. Porque ela acha que o convívio das cidades grandes não tem muitas coisas boas para oferecer. Tenho que ligar todo fim de semana, isso pra contar como estou, fazer um breve relatório da semana e dar sinal de vida. Mas confesso, cheguei a quatro meses e já conto os dias para o término do curso.
Como firmei um compromisso com a comunidade de que irei dar retorno de todo aprendizado e toda formação acadêmica. Isso só vem fortalecer a vontade de se formar e voltar o mais rápido possível à aldeia. Lugar onde nasci e onde quero viver por toda minha vida.
Gostaria de frisar uma frase de uma liderança indígena do povo Xucuru-Kariri de Alagoas, ela foi uma mulher que por defendeu não só a bandeira de seu povo, mas de todo os povos indígenas desse país. Em uma de suas falas referindo-se aos não índios, ela diz: “Eles acabaram com nossas folhas, nossos galhos, nossas árvores, nossas matas, nossos troncos... Mas esqueceram do mais importante, NOSSAS RAÍZES...” (MANINHA XUCURU-KARIRI) in memória.
A frase diz tudo. Por mais que tente nos destruir, que seja na exclusão social, no esquecimento cultural, na falta de valorização. Afinal, são 509 anos de massacre a cultura indígena, e essa continua do mesmo jeito, cada dia mais forte,mesmo com o massacre acontecendo. Temos que viver em uma sociedade que seja nossa, e não em uma que vem sendo imposta há 509 anos. Somos e sempre seremos os verdadeiros donos desta terra! Se o futuro pertence a nós, vamos trabalhar.
PORAN POTIGUARA
20/06/09
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Nota do editor:
Poran é um pequeno grande guerreiro (pequeno só na pouca idade!), mas supera grandes desafios impostos pelos estigmas da sociedade para adquirir respeito e autonomia, bem como diversos outros indígenas espalhados pelo Brasil, país este, que ainda os considera como incapazes de cuidar e gerir suas próprias vidas. O Estado ainda mantém os índios sob tutela!!
6 comentários:
Adimro muito esse garoto Tanielson - nome de "Guerra Poran", que assim como tantos outros indigenas está na batalha pela vitória pessoal caracterizando-se também profissional. Estendendo a bandeira do seu povo que a nossa verdadeira raíz, nossa verdadeira cultura. Viva aos Índios dono das terras!
BOA NOITE SUNAMITA,SAUDAÇÕES ACADÊMICAS SOU ESTUDANTE DO CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA DO BRASIL, ESTOU SERIAMENTE FOCADA EM ESCREVER MINHA MONOGRAFIA SOBRE OS ÍNDIOS BRASILEIROS, MAS ESTOU NA DÚVIDA PORQUE NÃO TENHO MUITOS LIVROS OU ARTIGOS SOBRE ELES, COMO PROFESSORA DE HISTÓRIA, FOCAMOS MUITO OUTROS CONTEXTOS, SEGUINDO OS LIVROS DIDÁTICOS, POR GENTILEZA, SE NÃO FOR MUITO ABUSO DE MINHA PARTE, ME DÊ SUA OPINIÃO SOBRE O QUE ESCREVER, NÃO QUERO REPETIR OS ERROS DE MUITOS COLEGAS QUE ACHAM QUE O QUE IMPORTA É SÓ A CULTURA, TEM MUITA COISA PRA SER DISCUTIDA NÃO É MESMO?, AGUARDO SUA RESPOSTA. ABRAÇOS. LILI
Querida Professora Aline,
Estou certa de que você não corre o risco de repetir os erros de alguns colegas, por ter demonstrado desde já esta preocupação e sensibilidade.Há muito ainda sobre o que escrever e descobrir acerca de nossos parentes - os índios.Caso se interesse, posso te enviar alguns contatos por email.
Grande abraço, e boa sorte.
Continuo a disposição.
Professora:
descobri seu blog por acaso e achei fascinante. Te escrevo por aqui, porque não tenho outlook e não pude mandar email.
Queria saber se posso utilizar um trecho dessa fala do Tanielson em um livro didático que estou escrevendo. Se autorizar, a editora enviará para vc um documento solicitando a autorizaçao.
Sou professor de Historia, ja aposentado e escritor de didáticos. Pode me conhecer melhor vendo meu blog: http://boletimdehistoria-ricardo.blogspot.com
Agradeço seu contato.
Ricardo
Nobre Professor Ricardo, um viva ao acaso!!!
Estou deveras honrada com seu comentário! Receba meu sincero e humilde agradecimento!Torço para que esta visita não seja a única! Seu blog é maravilhoso. Já tornei-me seguidora!
Quanto a publicação sobre meu amigo Poran (Tanielson), preciso da autorização dele, pois o texto foi escrito em um trabalho que ele realizou para a UNB,onde cursa Engenharia Florestal, mas acredito que ele deve aprovar a ideia! Entrarei em contato o quanto antes!
Abraços,
Sunamita Oliveira
Olá gostei muito da proposta de registro das experiências de indígenas. Parabéns!
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