Entrevista especial com Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin | |
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Para os índios guarani, não há distinção entre vida natural e sobrenatural. Por isso, explicam Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin, os acontecimentos cotidianos têm, além de uma base objetiva, um viés subjetivo “O povo guarani se considera eleito, mas precisa viver em um mundo imperfeito. Cada pessoa precisa aprender a conviver e a estabelecer um equilíbrio entre duas naturezas que a constituem – a humana e a divina. É esta ambivalência que constitui o desafio da vida humana, e que impele o guarani a superar sua natureza finita e buscar a perfeição que lhe aproxima da condição divina. Aprender a conviver e a conhecer os outros seres que habitam os limites do seu território é uma das estratégias deste povo. Talvez, por isso, suas atitudes não sejam propriamente de conflito e de enfrentamento aberto, mesmo quando há invasões em suas terras”. É assim que Roberto Antonio Liebgott, vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário – Cimi/RS e sua esposa, Iara Tatiana Bonin, doutora em Educação e professora da Universidade Luterana do Brasil - Ulbra, definem o povo guarani. Na entrevista que segue, concedida, por e-mail, para a IHU On-Line, eles enfatizam que a marca distinta dos guarani “é a sua mobilidade”. Nesse sentido, “a vida guarani pode ser pensada como um ‘contínuo caminhar’”. Segundo eles, tal estilo de vida caracterizado pela mobilidade colabora para “a produção de saberes, para a circulação maior de bens, de sementes, de ervas medicinais, e ainda proporciona às pessoas o desenvolvimento de certas capacidades que são consideradas importantes para assegurar o bem viver”. Iara Tatiana Bonin é graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, mestre em Educação pela Universidade de Brasília - UnB. Na Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, realizou o doutorado também em Educação. Por sete anos, atuou no Conselho Indígena de Roraima; e, por onze, no Conselho Indigenista Missionário – CIMI. Roberto Antonio Liebgott é vice-presidente do Conselho Indigenista Missionário – Cimi/RS e acompanha , há muitos anos, a luta e a trajetória do povo guarani no RS, Confira a entrevista. IHU On-Line - Quem são os guarani? Quantos subgrupos fazem parte desta etnia indígena e quais suas características? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - O povo Guarani era, de acordo com muitos relatos históricos, constituído por mais de quatro milhões de pessoas. Ocupava especialmente a região de mata úmida dos Rios da Bacia Platina, tendo chegado até a Bacia Amazônica. Este povo, também denominado Awá (termo que, em português, significa gente) é parte do grande tronco linguístico Tupi, e pertencente à família Guarani. São hoje mais de 280 mil pessoas, subdivididas em grupos (parcialidades), assim definidos: Kaiowá (também referidos na literatura acadêmica como Kaiová, Kayová ou Paï-Tavyterã), Nhandeva (referidos ainda como Xiripá e Ava Katu Ete), os Mbyá e ainda Guaraios (Bolívia). As comunidades estão distribuídas em mais de 400 aldeias em quatro países da América do Sul. Seu território tradicional atualmente se estende sobre grande parte do Brasil, principalmente no sul, ao norte da Argentina, oeste da Bolívia e em todo o Paraguai. Há mais de quatro milhões de falantes de guarani e, no Paraguai, ela se tornou uma das línguas oficiais. Entre as parcialidades do povo guarani, existem diferenças importantes, relativas aos costumes, expressões linguísticas, rituais, estilos de pensar e de viver. No entanto, pode-se dizer que existem unidades agregadoras, a partir das quais eles se articulam (sem, contudo, se confundir) e mantém intensa intercomunicação. Dentro de uma mesma parcialidade também há distinções – que tem a ver com idade, gênero, lugar social, local de moradia, entre outros aspectos. Tudo isso nos leva a reconhecer, mais uma vez, a pluralidade de maneiras de viver, que decorre das múltiplas histórias vividas por estes grupos e das relações que vão estabelecendo entre si e com os demais. Não há, portanto, um único e definitivo “jeito de ser guarani” e não seria possível “traduzir” seu estilo de pensar e de viver em poucas palavras. É necessário considerar as específicas e variadas situações em que eles vivem, as mudanças que se processam em suas práticas cotidianas, como efeito de muitos fatores, as alternativas que eles vão construindo para continuar vivendo em coletividades, no dinamismo de suas experiências riquíssimas de vida. Guarani na América Latina Em termos de localização, de modo geral, os Kaiowá vivem hoje em pequenas parcelas de seu território tradicional, em Mato Grosso do Sul, com uma população (no Brasil) superior a 40 mil pessoas. Os Nhandeva vivem no Sul do Brasil, Paraguai e Argentina, enquanto que os Mbya, que são em maior número, vivem na Argentina, Paraguai e Brasil, concentrando-se, de modo especial, no Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul (há um grupo familiar que vive hoje no estado do Pará). Os Mbya são conhecidos pela grande mobilidade, que corresponde a uma forma de percepção e de ocupação do território, mas também representa um estilo de relação constituído entre as pessoas que habitam esses lugares. IHU On-Line – Que aspectos culturais são próprios da tradição guarani? O que vocês destacam na história deste povo, desde a sua origem? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - Podemos destacar dois aspectos importantes da cultura guarani. O primeiro diz respeito à dimensão sagrada, que está presente no cotidiano da vida destes grupos. Esta é uma questão complexa, não sendo possível resumir sua cosmologia (amplamente descrita por Curt Nimuendajú, Bartomeu Meliá, Peirre Clastres, Graciela Chamorro, entre outros pesquisadores) em poucas palavras. No entanto, uma consideração importante pode ser feita nesta direção: para os guarani, não há uma distinção absoluta, ou uma linha divisória que separa aspectos da vida natural e sobrenatural. Assim, as ações cotidianas são marcadas por certa ritualidade, as explicações para os acontecimentos têm uma base objetiva e também subjetiva, as razões para algumas práticas e condutas são de ordem material e também espiritual. De acordo com muitos pesquisadores, que tem realizado estudos acadêmicos em diferentes épocas, o povo guarani se considera eleito, mas precisa viver em um mundo imperfeito. Cada pessoa precisa aprender a conviver e a estabelecer um equilíbrio entre duas naturezas que a constituem – a humana e a divina. É esta ambivalência que constitui o desafio da vida humana, e que impele o guarani a superar sua natureza finita e buscar a perfeição que lhe aproxima da condição divina. Aprender a conviver e a conhecer os outros seres que habitam os limites do seu território é uma das estratégias deste povo. Talvez, por isso, suas atitudes não sejam propriamente de conflito e de enfrentamento aberto, mesmo quando há invasões em suas terras. Em uma comunidade guarani é indispensável à existência de uma casa de reza, a Opy. Nela se estreitam os vínculos com o Sagrado, se realizam os rituais mais importantes, se estabelecem as condições para se ter saúde, se realizam os processos de nomeação e de cura. E nos rituais sempre está presente o cachimbo - petynguá, com o qual fazem uma espécie de defumação, que possibilita a purificação, em alguns casos, e permite a transformação de um certo objeto comum, em objeto guarani. Também nos rituais se observa o uso do bastão de taquara - o taquapy - da flauta, do violão, da rabeca, do maracá, que são alguns dos instrumentos que elevam o canto e dão força comunicativa aos rituais. Tudo isso é parte indispensável para o bem viver, na concepção Guarani. O valor da palavra Um segundo aspecto diz respeito à palavra, que para os guarani é um importante elemento de constituição da pessoa e de elaboração contínua de seu modo de viver. Estudiosos como Curt Nimuendajú e Bartomeu Meliá afirmam que os guarani são “o povo da palavra”, e a prática de escutar e de falar configura sua organização social, política, religiosa. Graciela Chamorro afirma, ainda, que a espiritualidade guarani é uma “experiência da palavra” ancorada em uma complexa teologia que só se pode observar frente a um estudo profundo e prolongado. É pela palavra que a pessoa guarani vai sendo constituída, e essa produção se inicia antes mesmo do nascimento de um novo ser, ou de sua concepção propriamente dita. Para eles a vida se inicia quando um componente divino é enviado e se coloca a caminho, até chagar e fazer morada em um corpo guarani. Essa porção divina é enviada em forma de palavra-alma e se torna pessoa à medida que vai sendo pronunciada, lida, inventada, através de palavras que são proferidas pelos pais, pelos líderes religiosos, pela comunidade, em diferentes momentos cotidianos e rituais. Observa-se, assim, que a palavra é um componente central no dia-a-dia dos guarani e ela se converte em conselhos e ensinamentos (dos pais para os filhos, dos anciãos – karaí – para os jovens, e assim por diante). Uma das maiores preocupações dos pais é assegurar o desenvolvimento da criança e faz necessário dizer que eles são extremamente afetivos e cuidadosos com ela, tratando-a como se fosse um hóspede querido, para que, então, se acostume com a vida, condição finita e humana. Ao longo da vida, uma pessoa guarani precisa aprender certas condutas que lhe permitam aproximar-se cada vez mais de sua porção divina, e, portanto da palavra que expressa a sua alma. Assim, o respeito a várias regras, no dia-a- dia, assegura que nela se mantenha e se aprimore as características divinas – ser generoso, escutar a palavra dos outros, compartilhar, ser leve, manter-se alegre, são manifestações de divindade. O contrário pode também ocorrer quando, por exemplo, as pessoas desrespeitam as regras sociais e, neste caso, a porção humana prevalecerá e elas estarão cada vez mais próximas dos animais. O significado central da palavra na vida dos guarani pode ser pensado, ainda, pelas formas como eles definem e organizam a chefia: pode-se dizer que o poder de alguém nestas sociedades não se estabelece pela coerção de um chefe que possui o direito de ser ouvido, e sim pela capacidade oratória desse chefe, que tem o dever de falar, de ser convincente naquilo que diz, utilizando, para isso, as palavras com sinceridade e falando com o coração. Os guarani nos falam continuamente que a palavra deve expressar a verdade, o bom sentimento, e deixar ver aquilo que somos. E, por acreditar nisso, eles são notáveis no exercício da tolerância, na diplomacia e do respeito pelos outros. Eles acreditam que a palavra tem o poder de construir o entendimento, quando proferida com sinceridade, por isso a principal forma de luta política desse povo se dá por meio do discurso – sempre que convidados a falar, eles elaboram sua intervenção de modo a estabelecer o entendimento e o respeito (partem, quase sempre de uma fala mais elogiosa, que valoriza o interlocutor), e só então apresentam sua reivindicação, para que esta possa ser efetivamente ouvida e compreendida. Ocorre que, na dinâmica das relações políticas da sociedade ocidental contemporânea, a palavra não funciona, necessariamente, como expressão da verdade e da mútua compreensão e, talvez, por isso, muitas vezes os discursos guarani não são vistos como formas de luta e nem como expressões de um firme posicionamento. É importante destacar, ainda como aspecto relevante, a dinamicidade da língua: os guarani mantém, de um modo geral, a comunicação cotidiana em sua própria língua, sendo o português e o espanhol línguas utilizadas para estabelecer relações com os outros. Em cada uma das parcialidades da etnia guarani, a língua falada apresenta diferenças importantes, de pronúncia, de estilo, de expressões, em função da realidade cultural, social e política nas regiões onde vivem. IHU On-Line - Que vínculo os índios guarani mantêm com a terra? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - Embora este povo possua vínculos ancestrais com um amplo território, eles vivem, em grande maioria, em pequenas porções de terra, com áreas que variam entre 5 a 500 hectares. No Brasil, a situação mais complexa é a de Mato Grosso do Sul, onde poucas áreas estão efetivamente demarcadas, sendo que uma grande parcela da população Kaiowá vive confinada em pequenas reservas e ou em acampamentos de beira de estradas. No Rio Grande do Sul, também existem diversas comunidades Mbyá vivendo às margens das rodovias. É preciso dizer, antes de mais nada, que esta não é uma opção dos guarani e, sim, uma condição que a eles foi imposta em função do modelo de ocupação e de desenvolvimento regional e nacional. Viver em pequenas porções de terra não é adequado a um povo para quem a terra é fonte de vida, é lugar onde se restabelecem elos entre eles e seus ancestrais, onde se celebra a vida, onde se cultiva a porção divina que vive em cada pessoa, e onde se organiza o viver. Sobre ela se estrutura o nhande rekó – o modo de ser guarani. Ainda em relação aos vínculos dos guarani com a terra, é importante lembrar que uma marca distintiva deste povo é sua mobilidade. Neste sentido, a vida guarani pode ser pensada como um “contínuo caminhar”. Eles se movimentam num amplo território, hoje compartilhado com muitas outras pessoas (e constituído também pela presença de cidades, de fazendas, de plantações, de matas). No entender de muitos estudiosos que se dedicam à cultura guarani, a mobilidade não se refere apenas a um modo de relacionamento com a terra, mas constitui também o nhande rekó, que prevê a mobilidade das pessoas e das famílias entre os grupos e a mobilidade dos grupos no interior do território mais amplo. Como estilo de vida, a mobilidade colabora para a produção de saberes, para a circulação maior de bens, de sementes, de ervas medicinais, e ainda proporciona às pessoas o desenvolvimento de certas capacidades que são consideradas importantes para assegurar o bem viver. Neste perambular constante, os guarani vão incorporando elementos de distintas regiões e culturas aos seus modos de viver, e vão também restabelecendo laços de parentesco, de colaboração, de partilha, aspectos fundamentais para a cultura e para a tradição deste povo. Os guarani possuem vínculos com um território geográfico amplo, não mais contínuo como no passado, que é compartilhado por diferentes sociedades e no qual eles se mantém perambulando, estabelecendo intercâmbios, formando aldeias em locais estratégicos, constituindo referenciais simbólicos e práticos. As formas de ocupação acontecem, portanto, através de deslocamentos concretos desses grupos, mas também pressupõem uma dimensão religiosa. IHU On-Line - Por que alguns guarani vivem à beira das estradas, em especial na região Sul do Rio Grande do Sul? Que aspectos antropológicos explicam esse fato? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - Os vínculos dos guarani com seu território são profundos e envolvem elementos materiais e espirituais, conforme assinalamos anteriormente. Para os guarani, a vida, em toda a plenitude e potencialidade, só pode se concretizar em um tekoha – um espaço específico onde se pode viver ao estilo guarani. De acordo com Bartomeu Melià, um tekoha não é um lugar qualquer, e sim um espaço assim identificado com a intervenção dos espíritos, que orientam o olhar do xamã (o Karaí). Neste lugar é que se dão as condições para que se realize o modo de ser guarani, e ele deve apresentar uma série de características que envolvem aspectos ambientais, sociais e sobrenaturais. É necessário que o Karaí sonhe com este local e, em geral, um tekoha deve ter água e matas, campos, animais, ervas, espaço para plantar e cultivar alimentos (o milho, a mandioca, batata doce, amendoim, feijão, melancia, abobora). Neste sentido, quando os guarani ocupam um espaço ínfimo, à beira de uma rodovia, o que estariam nos dizendo? Quase sempre essa ocupação é, na verdade, o limite mais próximo que eles conseguem estar de uma área mais ampla, identificada como um tekohá, e que quase sempre se situa “do lado de dentro” das cercas que dividem certas propriedades. Na atualidade, há uma intensa mobilização deste povo para que se realize a demarcação de suas terras, embora eles não utilizem estratégias de impacto e visibilidade, tal como fazem outros povos que ocasionalmente bloqueiam estradas, ocupam sedes de órgãos de assistência, etc. Existem cerca de 150 terras guarani a serem demarcadas no Brasil, e esta é uma responsabilidade do governo federal. No entanto, os poderes públicos têm agido de maneira negligente, desrespeitando prazos para os procedimentos demarcatórios, omitindo-se em conflitos que colocam em risco a vida de algumas destas comunidades e deixando de cumprir os preceitos constitucionais que estabelecem, clara e irrefutavelmente, o direito dos povos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam. Em todo o ano de 2009, o governo Lula emitiu apenas um decreto de homologação de terra para o povo guarani. O decreto, assinado em 21/12/2009, homologa a demarcação da terra indígena Arroio-Korá, no Mato Grosso do Sul, com 7.175 hectares. Infelizmente, dois dias depois, na véspera do dia de Natal, o ministro Gilmar Mendes, do STF, concedeu liminar aos fazendeiros e os indígenas não puderam comemorar nem mesmo esta única homologação. A luta pela terra Também devido à luta por suas terras e por serem obrigados a viverem confinados em pequenos espaços territoriais, várias lideranças indígenas têm sido vítimas de violências. O povo guarani é o que mais sofre violências no Brasil. O estado de Mato Grosso do Sul, onde vive o maior contingente populacional deste povo, continua sendo recordista violências e desrespeito aos direitos indígenas. Em 2009, o estado continuou se destacando no número de assassinatos de lideranças indígenas: foram 33 vítimas de assassinatos, mais da metade dos casos de todo o país. A prioridade do governo federal, evidenciada em diversas decisões tomadas nestes últimos anos, tem sido a de incentivar grandes empreendimentos econômicos, mesmo que estes possuam grandes impactos local, regional, ecológico e social. Infelizmente, muitas das obras construídas ou projetadas incidem sobre terras indígenas, e também os investimentos em monoculturas, que exigem amplas áreas de terra, acabam por desrespeitar limites de terras indígenas, dificultando as demarcações e gerando tensões e conflitos expressivos em determinadas regiões. No governo do presidente Lula registram-se os maiores índices de lucratividade de empresas, de instituições bancárias, e os menores números de demarcações iniciadas e finalizadas, e tais dados nos informam sobre o lugar que ocupa a temática indígena neste contexto. Também nestes anos verifica-se um crescimento assustador nos índices de violência praticada contra o povo guarani. IHU On-Line - Que lições Sepé Tiaraju deixa para os guarani? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - Uma consideração inicial importante se faz necessária, quando abordamos essa questão: embora o povo guarani, tal como a maioria dos povos indígenas que conhecemos, não vincule sua história a certos nomes, a certos heróis, a feitos individuais exemplares, como nós o fazemos, na atualidade pode-se dizer que Sepé Tiaraju é um nome relevante para eles, e isso se explica por diferentes razões. Possivelmente, por ter liderado um movimento de resistência significativo na história desse povo, Sepé seria lembrado, juntamente com outros tantos líderes. No entanto, na atualidade, o nome deste líder traz à memória os acontecimentos de mais de 250 anos, que marcam um processo de luta e de defesa das terras por eles ocupadas. Sepé é então um nome que faz lembrar e celebrar, no canto, na dança, nas palavras dos homens e mulheres de hoje, a histórica resistência de seus antepassados, em defesa da terra e da liberdade. Assim, quando os guarani dirigem-se para São Gabriel, a cada ano, na data em que ocorreu o massacre de mais de 1500 guarani, no conflito que envolveu os exércitos de Espanha e de Portugal, em disputa pela posse deste território, eles não apenas o fazem para lembrar de Sepé Tiaraju como um herói; eles seguem em caminhada, para lá realizar seus rituais, para proferir suas palavras e aconselhar os jovens. Lá eles também celebram a resistência, reativam o sonho e a esperança de ver garantidas as suas terras. Esta é, portanto, uma ocasião de encontro, e serve para dar materialidade à palavra, recontando acontecimentos marcantes, discutindo os atuais problemas e especialmente, escutando os discursos proferidos pelos karaí, que descrevem e, assim, antecipam o futuro desejado. IHU On-Line - Qual a importância da cultura guarani na formação da identidade do povo gaúcho? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - A resistência do povo guarani e os duros embates travados contra os exércitos da Espanha e Portugal, em defesa da terra, são muito valorizados por alguns segmentos sociais, intelectuais, militantes das causas populares e indígenas. Em livros de história são escassas as informações sobre estes enfrentamentos e lutas e, portanto, o que se tem acesso são fragmentos e relatos de histórias. Essas histórias são transmitidas a algumas parcelas da população através da tradição oral e do imaginário mítico, que vem sendo produzido a partir dos simbolismos em torno das representações de Sepé Tiaraju. O gauchismo tradicionalista acabou incorporando algumas representações de Sepé nos seus contos, versos, prosas, músicas. Mas essa incorporação, de fato, tende a acomodar os conflitos e tensões históricas e tudo ocorre como se houvesse uma harmoniosa integração cultural. Além disso, em algumas circunstâncias os sentidos são subvertidos – como, por exemplo, quando o brado “Alto lá, esta terra tem dono”, atribuído a Sepé Tiaraju, é incorporado a discursos de ruralistas, e passa a servir, então, como marca de uma apropriação fundiária que gerou a expulsão e a situação de vulnerabilidade que se encontram hoje os guarani. A expressão “Esta terra tem dono”, no entender guarani e no entender capitalista tem significados radicalmente distintos. IHU On-Line - Como esses subgrupos (ou parcialidades) étnicos guarani se modificaram ao longo do tempo? Que transformações sociais e culturais marcaram a trajetória deles? Roberto Antonio Liebgott e Iara Tatiana Bonin - No Brasil, existem pelo menos 240 povos indígenas diferentes, étnica e culturalmente falando. As realidades também são distintas em função da geografia, das relações e formas de contato, em função das perseguições, da discriminação, das políticas de estado, das interferências dos grupos econômicos, políticos e do Estado. Os guarani, assim como os demais povos que convivem cotidianamente com a sociedade envolvente, foram constituindo estratégias e mecanismos necessários para compreender e saber conviver com as demais culturas. As transformações ou modificações culturais são inevitáveis – aliás, não há cultura no mundo que não seja continuamente reinventada, confrontada com novas situações e com novas práticas. Exatamente porque são feitas de práticas cotidianas, e não apenas de um conjunto de aspectos vinculados à “tradição”, que as culturas - inclusive as nossas -, subsistem e se movimentam. Tal como as culturas ocidentais e nacionais, ao longo da história, as culturas indígenas vão se adaptando, criando e recriando as maneiras e modos de ser e de viver, reelaborando saberes, convenções, crenças, estruturas políticas, econômicas, religiosas, etc. É uma pretensão um tanto eurocêntrica a que nos leva a supor que ao incorporarmos, por exemplo, o computador, as câmeras digitais, os celulares e tantos outros novos artefatos, estaríamos aprimorando nossas culturas, e que as mudanças nas culturas indígenas seriam signos de “perda cultural”. Afirmar, no entanto que as culturas se transformam, não é o mesmo que dizer que isso ocorre da mesma maneira em todos os cantos do mundo e para todos os sujeitos. É importante ressaltar que as transformações são também resultantes de relações de poder e de jogos de força que, em muitos casos, resultam na submissão de alguns grupos ao estilo de vida ou aos padrões de outros. É assim que precisamos entender as imposições feitas aos guarani, quando estes são forçados, por exemplo, a viver em condições sub-humanas, e a sobreviver de programas assistenciais e de distribuição de cestas básicas para não morrer de fome, enquanto suas terras tradicionais continuam ocupadas, loteadas, invadidas. É preciso considerar, portanto, que a maior transformação nos modos de vida guarani decorre da não demarcação de suas terras, e da omissão do Estado no que se refere à garantia de seus direitos. Para ler mais: |
Reflexões sobre a educação, ação social e as Culturas Indígenas e Afro brasileira.
CONTATOS: sunamitamagalialbuquerque@hotmail.com /sunamitanativaoliveira@gmail.com
segunda-feira, 31 de maio de 2010
Os Guarani. O contínuo caminhar de um povo.
Anistia Internacional cita MS em relatório por situação dos guarani-kaiowá
O Mato Grosso do Sul foi citado no Relatório Nacional da Anistia Internacional sobre Violações dos Direitos Humanos por causa da situação dos índios Guarani-Kaiowá. O documento foi divulgado nesta semana e inclui também relatos sobre abussos praticados em presídios, conflitos agrários e por policiais no Brasil.
domingo, 30 de maio de 2010
PROFESSORES DE CHÃ-GRANDE DE LUTO
Depois de varias tentativas para que o prefeito desse uma resposta sobre o aumento de salário,demos a ele seis dias para que procurasse a Comissão de Base, responsável pelas negociações, representante da categoria, no entanto, não houve qualquer sinalização por parte da gestão manifestando interesse em atender as legitimas solicitações. O descaso gerou inquietação entre a categoria, que já estava insatisfeita também por causa do PCC (Plano de Cargos e Carreiras) que não saiu do papel. Resolvemos fazer uma parada de advertência no dia 28 de Maio, e que por coincidência, no mesmo dia em que estava sendo realizado o Dia de Literatura e outras artes na cidade. A gestão e a secretaria de educação resolveram realizar o evento sem os professores, aproveitando todos os trabalhos realizados por nós, colocando outras pessoas, especialemnte os contratados e cargos comissionados para ajudarem os alunos apresentarem. Apesar de algumas ameaças, a categoria estava unida e fomos para mais ou menos 140 professores ,todos de preto em sinal de protesto e tristeza pelo desrespeito com a categoria.
O gestor tentou impedir nossa passagem com o carro de som até o centro da cidade, bloqueando a rua com correntes e carro da policia, descumprindo a lei federal que garante a todo cidadão o direito de ir e vir, e dos funcionaŕios públicos de poder realizar protestos diante de insatisfação por desrespeito aos direitos trabalhistas. Mesmo assim, os professores eguiram até a praça que fica no centro de cidade, e de mãos dadas cantaram o Hino Nacional Brasileiro. Estamos aguardando agora que o gestor entre em contato conosco para que resolvamos tudo da melhor maneira possível.
Professora Ana Marta Vieira- integrante da Comissão de Base dos professores municipais de Chã-Grande
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Nota da Editora:
Será que temos uma proclamação de indepedencia da cidade de Chã-Grande, ou apenas mais um gestor que não cumpre as leis federais e destrata os educadores??
Que nome se daria a um sistema de governo onde o filho é eleito e maẽ governa?? Enviem suas sugestões! Publicaremos!
Aos educadores de Chã-Grande, nosso irrestrito apoio! Piso salarial é lei!!
sábado, 29 de maio de 2010
ALUNOS DO 4º PERÍODO DE PEDAGOGIA DA UVA GRAVATÁ CONHECEM ASSENTAMENTO (MST)
O intuito do trabalho foi de conhecer os projetos pedagógicos desenvolvidos no assentamento, que hoje servem de estudo e modelo para outros assentados, bem como para diversos movimentos de cunho social.
Além do professor Nildo Barbosa, participou a turma do 2º Período, assistidos pela professora Maria do Carmo, com a disciplina Educação e Trabalho.
Além de aplicar as teorias e práticas do pesquisador e professor Paulo Freire, tal qual Pedagogia do Oprimido, Pedagogia da Libertação e Pedagogia da Autonomia, a educação desenvolvida no assentamento busca primar por moldes que elevem a condição do homem do campo, dando-lhes subsídios para viverem de forma digna no meio rural, combatendo seta forma, o conhecido êxodo rural, bem como todos os problemas advindos do inchamento dos grandes centros urbanos, onde a aglomeração acontece em virtude de ser este, ao menos em tese, um local de concentração de renda.
Os alunos foram recepcionados pela agricultora e assentada Mauricéia, que também é Pedagoga, além de Rubineuza, uma das líderes do movimento e o estudante de Filosofia e também Júnior.
Uma lição aprendida em Normandia, que servirá para nossas vidas, trata da educação humanizadora, que forma o individuo com consciência, primando por laços familiares, afetivos, ligaos a natureza, a mãe-terra, minimizando os efeitos do capitalismo desenfreado e selvagem.
A educação pensada e executada em Normandia se contrapõe a formação de mão-de-obra apenas. O individuo é pensado como ser, capaz de sentir e desenvolver-se de forma saudável. Belo exemplo!!
Da direita para a esquerda: Prof. Nildo, Júnior, Mauricéia, Rubineuza e Profª Maria do Carmo (Carmem)
Urgente: Petição do Avaaz para salvar as florestas brasileiras!
O que é mais revoltante, é que os responsáveis por revisar essa importante lei são justamente os ruralistas, representantes do grande agronegócio. É como deixar a raposa cuidando do galinheiro!
Há um verdadeiro risco da Câmara aprovar a proposta ruralista – mas existem também alguns deputados que defendem o Código e outros estão indecisos. Nos próximos dias, uma mobilização massiva contra tentativas de alterar o Código, pode ganhar o apoio dos indecisos. Vamos deixar claro para os nossos deputados que nós brasileiros estamos comprometidos com a proteção dos nossos recursos naturais – clique abaixo para assinar a petição em defesa do Código Florestal e depois encaminhe esta mensagem par os seus amigos:
http://www.avaaz.org/po/salve_codigo_florestal/97.php?cl_tta_sign=74ab0f7ed1282fe2b476fa836dc83ab0
Enquanto o mundo todo está discutindo como preservar nossas florestas para futuras gerações, um grupo de deputados está fazendo exatamente o contrário: estão tentando entregar as nossas florestas para os responsáveis pela devastação e desmatamento do Centro-Oeste e da Amazônia. As alterações servem apenas para os latifúndios se expandirem mais, se houvesse uma revisão no Código, deveria ser para fortalecer proteções ao meio ambiente e apoiar pequenos produtores, e não para enriquecer o agronegócio.
As propostas absurdas incluem:
* Reduzir a Reserva Legal na Amazônia de 80% para 50%
* Reduzir as Áreas de Preservação Permanente como margens de rios e lagoas, encostas e topos de morro:
* Anistia aos crimes ambientais, sem tornar o reflorestamento da área uma obrigação
* Transferir a legislação ambiental para o nível estatal, removendo o controle federal
Essa não é uma escolha entre ambientalismo e desenvolvimento, um estudo recente mostra que o Brasil ainda tem 100 milhões de hectares de terra disponíveis para a agricultura, sem ter que desmatar um único hectare da Amazônia.
A proteção das floretas e comunidades rurais depende do Código Florestal, assim como a prevenção das mudanças climáticas e a luta contra a desigualdade do campo. Assine a petição para salvar o Código Florestal e depois divulgue!
http://www.avaaz.org/po/salve_codigo_florestal/97.php?cl_tta_sign=74ab0f7ed1282fe2b476fa836dc83ab0
Juntos nós aprovamos a Ficha Limpa na Câmara e no Senado. Se agirmos juntos novamente pelas nossas florestas nós podemos fazer do Brasil um modelo internacional de desenvolvimento aliado à preservação.
Com esperança,
Graziela, Alice, Paul, Luis, Ricken, Pascal, Iain and the entire Avaaz team
Saiba mais:
País tem 100 mi de hectares sem proteção - Estado de São Paulo:
http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100505/not_imp547054,0.php
Estudos ressaltam importância ambiental do Código Florestal - WWF:
http://www.wwf.org.br/informacoes/noticias_meio_ambiente_e_natureza/?24940/Estudos-ressaltam-importancia-ambiental-do-Codigo-Florestal
terça-feira, 25 de maio de 2010
MAIS UM PEDIDO DE SOCORRO DOS POVOS INDÍGENAS
INALIENÁVEIS.
"ORGANIZAÇÃO SOCIAL E ETNO-CULTURAL INDÍGENA
TEKO ÑEMOINGO - OSCIP GUARANY
CNPJ: 09.202.622/0001- 77
OSCIP-ORGANIZAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL DE INTERESSE PÚBLICO
Aldeia Ty Global Indígena Avá Guarani do Oco'y, "Tava Guasu Avá Guarani Retã".
Brasil - Paraguay – Argentina – Uruguay.
OSCIP GUARANY, TRABLHO EM EXECUÇÃO DOS AVÁ GUARANI, REGIÃO COSTA OESTE DO PARANÁ, TRÍPLICE
FRONTEIRA E MERCOSUL
Foz do Iguaçu, 15 de maio de 2010
O ESTADO DO PARANÁ E A OSCIP GUARANY (ALDEIA INDÍGENA AVÁ GUARANI DO OCO'Y)
"TERRITÓRIO LINDEIROS"
À SUA EXCELÊNCIA O SENHOR MINISTRO DA JUSTIÇA:
LUIZ PAULO TELLES BARRETO
A POPULAÇÃO AVÁ GUARANI DA TRIPLICE FRONTEIRA MUI RESPEITOSAMENTE VEM SOLICITAR UMA AUDIÊNCIA COM O MINISTRO DA JUSTIÇA, S.O.S. A NAÇÃO BRASILEIRA E AO MUNDO PELO RECONHECIMENTO DOS SEUS DIREITOS, SEGUNDO A CONSTITUIÇÃO DE 1988 – CAP. VIII, E NA DECLARAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA QUE SE CUMPRA OS DITÁMES APROVADO PELA RESOLUÇÃO DA "ASSEMBLÉIA GERAL 61/295 DE 13 DE SETEMBRO DE 2007, E QUE OS DIREITOS DOS AVÁ GUARANI SÃO PRIMÁRIOS E CONGÊNITOS, LEGÍTIMOS POR SI, QUE NÃO SE CONFUNDEM COM OS DIREITOS ADQUIRIDOS. NO SEU ARTIGO 1 O PRINCÍPIO DA AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS AVÁ GUARANI E DE TODAS AS ETNIAS.
TOMANDO POR BASE O ART.1 DO PACTO DE DIREITOS CIVIS E POLÍTICOS E O MESMO ARTIGO DO PACTO DE DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS: "TODOS OS POVOS TÊM DIREITO À AUTODETERMINAÇÃO” E POR FIM NO DECRETO PRESIDENCIAL 6040/2007.
Ñande RU oma ê ha oikuaapa opa mba é! ( Nosso PAI está olhando e sabes todas as coisas!)
Tupã Oporaiva
Ta añete"
NOVOS OPRESSORES DOS POVOS INDÍGENAS
Comunidade Kaingang será removida a força do Morro Santana nos próximos dias
24/05/2010 · Deixe um comentário
Na última quinta-feira (20) aconteceu na 6 Vara Ambiental, Agrária e Residual do Tribunal Regional Federal de Porto Alegre a última Audiência para operacionalização do cumprimento da ordem liminar de reintegração de posse movida pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul contra a Comunidade Kaingang do Morro Santana. Presidida pela juíza Clarides Rahmeier a audiência contou com a presença de representantes do Ministério Público Federal e da Fundação Nacional do Índio, dos Departamentos Jurídico e de Segurança da UFRGS, oficiais de justiça federal, pesquisadores da antropologia, e também do líder da Comunidade kaingang Eli Fidelis e do representante kaingang da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPIN SUL) Jaime Kêntag Alves.
Por diversas vezes durante a audiência os líderes kaingang buscaram a palavra mas foram impedidos pela juíza com a justificativa de que aquele era um momento de operacionalização da remoção. Ainda que interrompido pela juíza, o líder Eli afirmou que sua comunidade resistirá a remoção uma vez que seus direitos como indígena que não foram respeitados nem considerados pela decisão do tribunal em audiências anteriores.
Os representantes da UFRGS tentaram ainda negociar uma retirada pacífica da comunidade de sua área, mas foram impedidos pela juíza com o argumento de que o tempo de negociação havia acabado. Representantes do MPF e da FUNAI pediram garantias de que os kaingang continuarão tendo acesso à área uma vez que ela é reconhecidamente um importante espaço de coleta de cipós, taquara e ervas para sua medicina tradicional. A universidade consentiu reconhecendo que o Morro Santana vem sendo tradicionalmente manejado pelos indígenas há 20 anos sem qualquer ônus.
Ao final da reunião o líder Eli solicitou informações da juíza, dos representantes da FUNAI e da UFRGS sobre qual seria o destino dado às famílias após a remoção. Em resposta a solicitação, a juíza Clarides Rahmeier que afirmou não ser este um problema dela ou da universidade, sentenciando que a polícia federal efetivará nos próximos dias a remoção de sua comunidade com presença da FUNAI e de representantes da UFRGS.
Abalados com a decisão da juíza após a reunião os líderes kaingang pediram o auxílio de todos para que não seja levada adiante essa injustiça. “Já são 510 anos de sofrimento do povo índio que ainda está longe de acabar, pedimos que nos ajudem, pedimos para os brancos que estão do nosso lado que não deixem que tirem o futuro das nossas crianças” disse Jaime Kêntág
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Comentários que fazem bem pra gente...
Parabéns a VOCÊ e a eles/as!
Penso que assim estamos contribuindo enormemente com os povos indígenas e especialmente com os Xukuru, para a superação de pré-conceitos, equívocos e desinformações.
Abçs.,
Edson Silva
(edson.edsilva1@gmail.com)
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*Edson Hely Silva - professor do Colégio de Aplicação da UFPE. Doutor em História Social pela USP.
segunda-feira, 24 de maio de 2010
Repassando...
MARINA
Por José Ribamar Bessa Freire*
Há pouco, Caetano Veloso descartou do seu horizonte eleitoral o presidente Lula da Silva, justificando: “Lula é analfabeto”. Por isso, o cantor baiano aderiu à candidatura da senadora Marina da Silva, que tem diploma universitário. Agora, vem a roqueira Rita Lee dizendo que nem assim vota em Marina para presidente, “porque ela tem cara de quem está com fome”.
Os Silva não têm saída: se correr o Caetano pega, se ficar a Rita come.
Tais declarações são espantosas, porque foram feitas não por pistoleiros truculentos, mas por dois artistas refinados, sensíveis e contestadores, cujas músicas nos embalam e nos ajudam a compreender a aventura da existência humana.
Num país dominado durante cinco séculos por bacharéis cevados, roliços e enxudiosos, eles naturalizaram o canudo de papel e a banha como requisitos indispensáveis ao exercício de governar, para o qual os Silva, por serem iletrados e subnutridos, estariam despreparados.
Caetano Veloso e Rita Lee foram levianos, deselegantes e preconceituosos. Ofenderam o povo brasileiro, que abriga, afinal, uma multidão de silvas famélicos e desescolarizados.
De um lado, reforçam a ideia burra e cartorial de que o saber só existe se for sacramentado pela escola e que tal saber é condição sine qua non para o exercício do poder. De outro, pecam querendo nos fazer acreditar que quem está com fome carece de qualidades para o exercício da representação política.
A rainha do rock, debochada, irreverente e crítica, a quem todos admiramos, dessa vez pisou na bola. Feio.“Venenosa! Êh êh êh êh êh!/ Erva venenosa, êh êh êh êh êh!/ É pior do que cobra cascavel/ O seu veneno é cruel…/ Deus do céu!/ Como ela é maldosa!”.
Nenhum dos dois - nem Caetano, nem Rita - têm tutano para entender esse Brasil profundo que os silvas representam.
A senadora Marina da Silva tem mesmo cara de quem está com fome? Ou se trata de um preconceito da roqueira, que só vê desnutrição ali onde nós vemos uma beleza frágil e sofrida de Frida Kahlo, com seu cabelo amarrado em um coque, seus vestidos longos e seu inevitável xale? Talvez Rita Lee tenha razão em ver fome na cara de Marina, mas se trata de uma fome plural, cuja geografia precisa ser delineada. Se for fome, é fome de quê?
O mapa da fome
A primeira fome de Marina é, efetivamente, fome de comida, fome que roeu sua infância de menina seringueira, quando comeu a macaxeira que o capiroto ralou. Traz em seu rosto as marcas da pobreza, de uma fome crônica que nasceu com ela na colocação de Breu Velho, dentro do Seringal Bagaço, no Acre.
Órfã da mãe ainda menina, acordava de madrugada, andava quilômetros para cortar seringa, fazia roça, remava, carregava água, pescava e até caçava. Três de seus irmãos não aguentaram e acabaram aumentando o alto índice de mortalidade infantil.
Com seus 53 quilos atuais, a segunda fome de Marina é dos alimentos que, mesmo agora, com salário de senadora, não pode usufruir: carne vermelha, frutos do mar, lactose, condimentos e uma longa lista de uma rigorosa dieta prescrita pelos médicos, em razão de doenças contraídas quando cortava seringa no meio da floresta. Aos seis anos, ela teve o sangue contaminado por mercúrio. Contraiu cinco malárias, três hepatites e uma leishmaniose.
A fome de conhecimentos é a terceira fome de Marina. Não havia escolas no seringal. Ela adquiriu os saberes da floresta através da experiência e do mundo mágico da oralidade. Quando contraiu hepatite, aos 16 anos, foi para a cidade em busca de tratamento médico e aí mitigou o apetite por novos saberes nas aulas do Mobral e no curso de Educação Integrada, onde aprendeu a ler e escrever.
Fez os supletivos de 1º e 2º graus e depois o vestibular para o Curso de História da Universidade Federal do Acre, trabalhando como empregada doméstica, lavando roupa, cozinhando, faxinando.
Fome e sede de justiça: essa é sua quarta fome. Para saciá-la, militou nas Comunidades Eclesiais de Base, na associação de moradores de seu bairro, no movimento estudantil e sindical. Junto com Chico Mendes, fundou a CUT no Acre e depois ajudou a construir o PT.
Exerceu dois mandatos de vereadora em Rio Branco, quando devolveu o dinheiro das mordomias legais, mas escandalosas, forçando os demais vereadores a fazerem o mesmo. Elegeu-se deputada estadual e depois senadora, também por dois mandatos, defendendo os índios, os trabalhadores rurais e os povos da floresta.
Quem viveu da floresta, não quer que a floresta morra. A cidadania ambiental faz parte da sua quinta fome. Ministra do Meio Ambiente, ela criou o Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo de Desenvolvimento para gerir as florestas e estimular o manejo florestal.
Combateu, através do Ibama, as atividades predatórias. Reduziu, em três anos, o desmatamento da Amazônia de 57%, com a apreensão de um milhão de metros cúbicos de madeira, prisão de mais 700 criminosos ambientais, desmonte de mais de 1,5 mil empresas ilegais e inibição de 37 mil propriedades de grilagem.
Tudo vira bosta
Esse é o retrato das fomes de Marina da Silva que - na voz de Rita Lee - a descredencia para o exercício da presidência da República porque, no frigir dos ovos, “o ovo frito, o caviar e o cozido/ a buchada e o cabrito/ o cinzento e o colorido/ a ditadura e o oprimido/ o prometido e não cumprido/ e o programa do partido: tudo vira bosta”.
Lendo a declaração da roqueira, é o caso de devolver-lhe a letra de outra música - ‘Se Manca’ - dizendo a ela: “Nem sou Lacan/ pra te botar no divã/ e ouvir sua merda/ Se manca, neném!/ Gente mala a gente trata com desdém/ Se manca, neném/ Não vem se achando bacana/ você é babaca”.
Rita Lee é babaca? Claro que não, mas certamente cometeu uma babaquice. Numa de suas músicas - ‘Você vem’ - ela faz autocrítica antecipada, confessando: “Não entendo de política/ Juro que o Brasil não é mais chanchada/ Você vem… e faz piada”. Como ela é mutante, esperamos que faça um gesto grandioso, um pedido de desculpas dirigido ao povo brasileiro, cantando: “Desculpe o auê/ Eu não queria magoar você”.
A mesma bala do preconceito disparada contra Marina atingiu também a ministra Dilma Rousseff, em quem Rita Lee também não vota porque, “ela tem cara de professora de matemática e mete medo”. Ah, Rita Lee conseguiu o milagre de tornar a ministra Dilma menos antipática! Não usaria essa imagem, se tivesse aprendido elevar uma fração a uma potência, em Manaus, com a professora Mercedes Ponce de Leão, tão fofinha, ou com a nega Nathércia Menezes, tão altaneira.
Deixa ver se eu entendi direito: Marina não serve porque tem cara de fome. Dilma, porque mete mais medo que um exército de logaritmos, catetos, hipotenusas, senos e co-senos. Serra, todos nós sabemos, tem cara de vampiro. Sobra quem?
Se for para votar em quem tem cara de quem comeu (e gostou), vamos ressuscitar, então, Paulo Salim Maluf ou Collor de Mello, que exalam saúde por todos os dentes. Ou o Sarney, untuoso, com sua cara de ratazana bigoduda. Por que não chamar o José Roberto Arruda, dono de um apetite voraz e de cuecões multi-bolsos? Como diriam os franceses, “il péte de santé”.
O banqueiro Daniel Dantas, bem escanhoado e já desalgemado, tem cara de quem se alimenta bem. Essa é a elite bem nutrida do Brasil…
Rita Lee não se enganou: Marina tem a cara de fome do Brasil, mas isso não é motivo para deixar de votar nela, porque essa é também a cara da resistência, da luta da inteligência contra a brutalidade, do milagre da sobrevivência, o que lhe dá autoridade e a credencia para o exercício de liderança em nosso país.
Marina Silva, a cara da fome? Esse é um argumento convincente para votar nela. Se eu tinha alguma dúvida, Rita Lee me convenceu definitivamente.
sexta-feira, 21 de maio de 2010
PROFESSORES DE GRAVATÁ PARTICIPAM DA X ASSEMBLEIA XUKURU DO ORORUBÁ
Particularmente, preciso deixar meu relato sobre o que representou para mim esta experiência. Convivo com o povo xukuru há aproximadamente 2 anos, mas ainda não tinha tido oportunidade de participar de uma Assembleia, muito menos, de entrar no espaço sagrado, onde os guerreiros que tombaram na luta foram plantados.
Sempre registrei aqui a receptividade do povo, algo comum aos xukuru para com aqueles que são simpatizantes da causa e aliados na luta, como é meu caso, também de conhecimento público.Desta vez, não foi diferente das outras 04 visitas que realizei.
Fizemos o percurso até bem próximo de Pedra D'Água, de carro, algo em torno de uns 3 km. A subida até a mata é relativamente curta, com uma visão da natureza bucólica. Tudo é grandiosamente belo, e mágico.
Alguns colegas pareciam crianças quando ganham doces, de tanto êxtase, fotografando, filmando. O novo e o diferente exercem fascínio sobre qualquer um, e esta ocasião realmente era digna de tudo isso. Não era pra menos. Confesso que ser reconhecida pelo cacique e por algumas lideranças, como o irmão do cacique - Gordo, o Prof. Adjailson e outros, me deixou super-honrada. Foi outro momento ímpar, poder rever amigos, parentes e abraçá-los. De fato, me sinto em casa!
Assistimos a missa com expectativa, eu particularmente, por não professar a fé católica, confesso ter tido uma grata surpresa com a fala coerente do Bispo de Pesqueira, Dom José. Conciso, equilibrado e muito feliz em suas colocações, voltou a manifestar seu apoio ao povo Xukuru e a todas as lideranças que continuam sendo criminalizadas.
Não sou expert em cálculos, mas creio que havia umas 2 mil pessoas acompanhando a missa, entre crianças, jovens e adultos, além de várias pessoas idosas.
Retornamos até a casa de D. Zenilda, para aguardar o horário de saída da marcha - 14 h. Entramos em uma fila para pegar um lanche, e é claro que não pude deixar de observar que, em meio a mais de 3 mil pessoas, não houve empurra-empurra, nenhuma desordem. Todos aguardavam pacientemente para pegar pão e suco, de forma ordenada, como a ocasião pedia.
Sentamo-nos, eu, o Prof. Lenilson, a Profª Dedé e Profª Nalva buscando a sombra de algumas árvores, enquanto o outro grupo de professores preferiu seguir até Pesqueira para almoçar.
Pontualmente, as 14 horas, já estávamos no meio do povo, na estrada, o Cacique subiu na porteira que delimita a entrada da aldeia, e todos, repito, todos em silêncio, do maior ao menor, sem que necessitasse uso de microfone, muito menos de gritos, responderam ao seu chamado: "Digo ao povo que avance"!! Uníssono: "NÓS AVANÇAREMOS"!
Até agora, ao repetir esta frase, sinto o corpo todo arrepiar. Só quem esteve lá provavelmente entenderá do que falo, mas, mesmo quem apenas ler este texto, e ao ver as imagens, creio que poderá sentir um pouco a magia que experimentamos nesse dia, nesse momento. A determinação, a força, a garra e organização de um povo com seu líder à frente é algo que impressiona e extasia.
Ao abrir o portão, todos, cantando, em marcha firme e rápida, seguiram as lideranças por aproximadamente 5 km, a pé, até o Bairro Xukuru, onde o Cacique Chicão foi assassinado, para realização de mais um ato público, com a presença de outros indígenas, como é o caso da liderança Potiguar - o Capitão,e uma jovem Truká, além de Eliene, do Centro de Cultura Luis Freire, integrantes do CIMI, UFRPE, e alguns politicos como Humberto Costa.
A data já é um marco. Cada rosto, cada palavra que escutei e tudo que vi ficarão guardados em meu coração e em minha memória para sempre. Haverá outras Assembleias, e farei o possivel para participar delas, mas essa, foi a primeira, e desta forma, única!
Meu muito obrigada ao povo Xukuru, por me permitir fazer parte deste momento sagrado! A luta continua, sempre!
Acesse:
www.petitiononline.com/xukuru/petition.html
(para Jornal Igreja Nova. Recife, abril, 2005).
XICÃO XUKURU: “Ele foi plantado para que dele nasça novos guerreiros”
Por Edson Hely Silva *
O dia 20 de maio é de luto para o povo Xukuru do Ororubá em Pesqueira. Era uma quarta-feira, um dia como outro qualquer da feira semanal na cidade, momento em que os índios xukurus descem de suas aldeias na Serra do Ororubá para comercializar seus produtos, comprar os gêneros que necessitam, resolver alguma pendência, etc. Nesse dia em 1998, quando o Cacique Xicão estacionava o carro na frente da casa de sua irmã, no Bairro Xukurus, um estranho se aproximou e a queima roupa disparou vários tiros assassinando o Cacique ainda dentro do veículo, fugindo o pistoleiro em seguida.
Com o Cacique Xicão, o povo Xukuru a partir dos anos 1980 retomou a mobilização por suas terras secularmente invadidas por fazendeiros. Após a participação na campanha da Assembléia Nacional Constituinte, com a expressiva liderança e atuação do Cacique, motivados pelas conquistas na Constituição de 1988, os Xukuru articulados com setores da sociedade civil, como o CIMI (Conselho Indigenista Missionário, órgão anexo à CNBB), iniciaram a retomada de seu território tradicional, reocupando áreas de várias fazendas.
A liderança de Xicão atraiu a ira dos fazendeiros, muitos deles membros da oligarquia de Pesqueira. Ele passou a receber várias ameaças de morte. Mesmo após o brutal assassinato de Xicão e posteriormente do líder Chico Quelé em agosto/2001, embora bastante abalado, o povo Xukuru continuou por meio da articulação interna, o processo de organização e mobilização pela conquista de seus direitos, de suas terras hoje reocupadas em cerca de 85%.
Por essa razão, o 20 de maio é também um dia de reconhecimento e afirmação indígena, de protesto em memória do Cacique Xicão, pela impunidade das violências contra os povos indígenas e suas lideranças. Nesse sentido, anualmente ocorre a Assembléia do povo Xukuru quando são discutidos os problemas e elegidas as prioridades de trabalho para os próximos meses. Após um ato religioso no centro da mata na Aldeia Pedra D’ Água, local em que Xicão foi “plantado”, é realizada uma grande caminhada, com a participação massiva dos Xukuru, além de indígenas de outras delegações de várias partes do Brasil, aliados e muitas pessoas solidárias com os povos indígenas, que descem da Serra do Ororubá, passam pelas ruas centrais de Pesqueira e vão até o local onde Xicão foi assassinado, onde um multidão fazem um ato público em sua memória.
A leitura da trajetória de atuação do Cacique Xicão nos faz lembrar de outras lideranças, a exemplo de Margarida Maria Alves, camponesa, líder sindical em Alagoa Grande/PB, assassinada a mando de fazendeiros nos anos de 1980, que afirmava “morro, mas não fujo da luta!”. Como Santos Dias, líder operário, assassinado pela polícia, na mesma época, durante uma greve dos metalúrgicos em São Paulo, e de tantas outras lideranças mortas na defesa de uma sociedade plural, de igualdade, justiça e dignidade para todos/as.
A persistência do Cacique Xicão, de Chico Quelé, o empenho, a luta, suas vidas e de tantos outros/as que lutaram pelo reconhecimento dos direitos indígenas, da justiça e vida plena, não foi em vão: “Do sangue de Margarida, margaridas!” e como dizem os Xukuru sobre Xicão, “ele não foi enterrado, ele foi plantado, para que dele nasça novos guerreiros!”.
Somos chamados/as para testemunhar a concretização dessas afirmações no próximo dia 20 de maio indo a Pesqueira.
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Edson Silva é professor no Col. de Aplicação/CENTRO DE EDUCAÇÃO-UFPE.
E-mail: edson.edsilva@gmail.com
Aproximadamente 05 km de caminhada até o Bairro Xukuru - eu, Dedé, Lenilson e Nalva, com a força de Tupã!!